sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Queda na Gruta de Chaval/CE.

Em 1978, no mês de novembro, período de festejos de N. Srª de Lourdes, minha mãe fez, à pé, o percurso entre Barroquinha e Chaval, para pagamento de uma promessa.

Ela e outras mulheres, partiram de nosso distrito, rumo à Chaval, por volta das quatorze horas, em caminhada, com a pretensão de chegarem antes do anoitecer na cidade vizinha. E assim, participarem do evento religioso, em cumprimento à promessa.

Durante o percurso, contou minha mãe, as mulheres rezavam, cantavam hinos de louvou, mas também, brincavam bastante. Isto, sob as vista dos demais viajantes que passavam de carros, bicicletas e a cavalo.

Lá chegando, conforme planejado, foram se estabelecer nas casas de amigos.

Eu, o meu pai e meus irmãos, fomos de carro, somente à noite.

Ao chegarmos, localizamos dona Gouveinha já assistindo a Missa. Para não incomodá-la, meu pai resolveu nos levar para passear um pouco. Lá vai, seu Vicente, levar seus três comportados pupilos para conhecer a cidade, comer pipocas e bombons.

Andando pelo lugar, meu pai, segurava nas mãos dos meus irmãos menores e permitia que eu, por ser um pouco maior, andasse apenas ‘encostado’ neles. Vez em quando, ele colocava meu irmão Paulo, na época, Nenen, assim o chamávamos, nos braços.

De frente à Gruta, então, resolvemos subir.

Com aqueles degraus inclinados, eu nunca tinha visto nada igual, a Gruta estava lotada de gente, subindo e descendo. Quando já estava chegando ao topo, solto sem pegar em nada nem em ninguém, eu me desequilibrei, ‘prantei-me’ no chão e saí ‘bolando’ escada a baixo.

Meu pai, coitado, aflito, não sabia o que fazer. Se, corria pra me salvar ou deixava meus irmãos livres, correndo mesmo risco.

Desci uns dez degraus, machucando as costas a cabeça e os joelhos até chegar, finalmente, nos pés do senhor Chico Baité, que naquele instante, também subia, de mãos dadas com uma moça, e me amparou.

Ora, o choro foi instantâneo. Só parei, quando reencontrei minha mãe, que cuidou dos arranhões e me acalmou. Mas, fiquei dolorido por mais de uma semana.

Oh lembrança, essa!

Aos domingos, em Barroquinha!

Eu passava a semana inteira, esperando o dia de domingo na nossa Barroquinha.

Morávamos, no quadro da rua, era sempre um sonho dos meus pais, próximos da Igreja, à beira da rodagem que ligava Camocim à Chaval, na terceira casa, contando da esquina da calçada alta, vizinha à da moageira de sal do senhor Chico Benício.

Aos domingos, logo cedo, parava quase na nossa porta, um caminhão que transportava uma ‘ruma’ de gente, bagagens e animais que vinham do distrito vizinho, de Araras.

Mesmo menino, recordo que este caminhão, não sei dizer a quem pertencia, tinha algo peculiar que nunca mais vi em lugar algum. Sua ignição, ou seja, pra ‘botar’ o motor para funcionar, o ajudante do motorista, tinha que ter um, utilizava-se de uma manivela colocada na parte frontal do veículo.

Depois de várias giradas e de muita força dispensada, era que o ‘bicho’ pegava.

Os passageiros que saltavam do velho caminhão, logo se espalhavam pelo lugar, quando não, alguns adentravam logo nas mercearias do senhor Raimundo Dazico e do senhor Letácio. E, a partir dali, tome cachaça!

No Paço Novo ou Rua do Ouvidor, especialmente nas bodegas do mercado, aglomeravam-se inúmeros cavalheiros e amazonas, que tinham as mesmas intenções e desejos dos passageiros do caminhão, porém, vinham de outros lugares arredores: Unha-de-gato, Sertão, Juazeiro, Lagoa do Mato, Mucambo, Pernambuco, Barroquinha dos Fiéis, Ilha, etc., por que não dizer também, Bitupitá.

Interessante, era que os cavalos eram mais enfeitados, de que quem os montava. Tamanha a simplicidade do nosso povo. Preocupavam-se mais com a beleza das celas nos animais, que a de suas próprias roupas. Eu, também, comungava com isso. Embora não possuísse nenhum cavalo.

A grande maioria, quem não bebia, vinha apenas visitar os parentes ou participar de algum evento religioso, se estivesse acontecendo, ou ainda, às compras de mantimentos. Mais o certo é que, nosso distrito ficava cheio de gente de fora.

Por volta do meio dia, em diante, a ‘negrada’, em bom barroquinês, começava ir embora, antes que o ‘sol esquentasse’ ainda mais.

À tarde, quase sempre, a diversão era assistir aos jogos da seleção de Futebol de Barroquinha, que de amistosos não tinham nada, vez por outra, alguém puxava uma faca, arrumando confusão.

O time era bom e, quando não saía, recebia outros times da região em um campo, que ficava no descampado longo, existente em frente ao Colégio Carmelita Véras. Ou, ainda, no campo do Edmário. Era tão longo, o descampado, que chegavam a pousar, pequenos aviões.

Na inauguração do Colégio Carmelita Veras, por exemplo, o governador Adauto Bezerra, pousou na porta. Eu e o meu pai, estávamos lá!

Depois, outro campo de futebol, foi criado em um dos terrenos do senhor Oliveira, no bairro da Caucaia. Aliás, segundo meu pai, senhor Oliveira, foi um bom goleiro em sua juventude.

Não conseguiria lembrar o nome de todos os nossos atletas, nem tentaria, para não cometer injustiças, esquecendo de alguém. Porém, lembro, o meu primo Potó, criado pela minha avó Chicota, que parecia uma mistura de calango com sibiti, era um dos goleiros da época.

Pela noitinha, as ‘radiadoras’ da Igreja ecoavam músicas do Padre Zezinho, um pouco antes da batida no sino, chamando os católicos para o Culto Dominical. Que, por ausência de padre na localidade, eram sempre celebrados pelo meu pai, Vicente, Dirigente do dia do Senhor. Missão, que recebeu do queridíssimo Mons. Inácio Nogueira Magalhães, pároco da região.

Durante o Culto, que tinha início às dezenove horas, e principalmente após o término deste, a juventude de Barroquinha, reunia-se na pracinha, ao lado da Igreja, passeando, gastando sola de sapato, de um lado para o outro, no sentido horário e no sentido contrário. Quando não, sentada nos bancos.

Ali, se iniciava as paqueras, os namoros e os romances dos rapazes e moças, continuados nas tertúlias, que tocavam os sucessos dançantes da época.

As tertúlias, eram tocadas em um pequeno salão, existente por trás de um dos ponto de loja, no inicio da Rua do Ouvidor, com acesso ao lado do último ponto, alugado pela minha ex-professora, senhora Socorro do Mundim, junto ao senhor Pedro Véras.

Depois que fiquei mais crescido, foi inaugurado o Imperial Clube. As tertúlias, então, passaram a ser realizadas neste novo espaço. Mais amplo e com capacidade para maior número de pessoas.

Daí, o meu dia acabava e voltava ao marasmo da semana, aguardando o próximo domingo.